sábado, 24 de julho de 2010

VOLTE, "JOÃO SEM MEDO" ! DA FRANÇA, JON ITCAINA FALA SOBRE O FUTEBOL FRANCÊS E JOÃO SALDANHA - 12/12/2008

Saldanha: montou a Seleção de 70 e peitou a Ditadura
PUBLICADO NO "FUTEBOL FENÔMENO SOCIAL" em 12/12/2008
 
ATENÇÃO: MANTIVE O E-MAIL EXATAMENTE COMO ELE ME MANDOU, SEM CORRIGIR UMA LETRA. O PORTUGUÊS MELHOROU!

Estou sentado na mesa de um botequinho de um bairro popular de Paris, fugindo do vento gelado da rua. De repente, o meu vizinho, um baixinho cansado sem idade joga o jornal L’Equipe em cima da minha mesa sem falar nada nem sequer olhar para mim; oups, esta com uma cara de poucos amigos…deve ser grave… , começo a ler : Ontem, o meu time, os "Girondins de Bordeaux" perderam o jogo decisivo da ultima jornada da Liga dos Campeões contra a Roma, 2 a 0. Como sempre, não vai ter time francês classificado – a não ser o Lyon – para as oitavas de final da mais prestigiosa competição do velho continente. O jornalista, escreve em um estilo nervoso e dramático, como para enfatizar a profundidade do abismo que separa o primeiro mundo da bola, Espanha, Itália e Inglaterra, do resto do mundo…sem falar dos candidatos emergentes como os times portugueses e/ou um pouco decadentes como Alemanha…Pô, como que a gente conseguiu cair tão para baixo, tendo os portugueses e os alemães na nossa frente ! POUCA VERGONHA berra o meu vizinho, J. Pierre ; "Se eu estivesse no governo, ia chamar de volta todos os craques da nossa seleção ( Henry, Anelka, Ribery …) pra jogar na pátria ; eles vão embora porque a gente não é capaz de pagar um salário decente (…) pros caras ; é um escândalo que os jogadores de futebol da seleção paguem tantos impostos, com o que eles fazem pra nação" grita o querido Jean Pierre ; excitado, não cala mais "se eu fosse presidente ia contratar todo esse povo com o dobre do salario que eles recebem lá nos países vizinhos"…Pois é… É um escândalo ver este povo francês que chora o tempo todo contra o desmanchamento da securidade social, do direito do trabalho e as carências da saúde pública e de um outro lado, acha criminal de pedir imposto e outras taxas sociais aos jogadores de futebol franceses … É verdade! Tá na hora de pedir pro governo de dar esses privilégios à caras que vão pra Inglaterra receber 100000 euros por mês líquidos enquanto os times franceses não podem oferecer mais do que a metade por causa dos impostos e taxas sociais… O que valem 70 anos de lutas e conquistas sociais, de vidas sacrificadas na frente de uma "oitava de final" de liga dos campeões ? Pô, vou deixar este país de comunistas assim que puder…


Falando em comunista, acabei de ler uma biografia do João Saldanha, por André Iki Siqueira. Comunista e técnico da seleção no meio da ditadura…. Só no Brasil mesmo…O que é que ele falaria da cabeçada do Zidane na final do campeonato mundial de 2006? Será que ele teria gostado daquilo ? Que falta você me faz hoje João, dentro desse boteco…da vontade de pegar todo esse povo pelo pescoço...na semana passada, nossa brilhante elite futebolística chamou a atenção da mídia : Um ex-jogador Petit ( aquele loirinho que fez o terceiro gol na copa de 98 ) escreveu ( com mula… ) um livro sobre a « hipocrisia do meio futebolístico onde o dinheiro "empodrece" tudo e muda as cabeças » um grande momento de literatura sem dúvida. « Eu sou rebelde, fico longe dos jornalistas e outros paparazzis » disse o nosso amigo rebelde em um dos programas mais vulgar e fofoqueiro da televisão na hora mais assistida…ficou duas horas falando do umbigo dele, e do dinheiro indecente e podre que rolava no futebol…coitadinho rebelde que estava tentando ganhar muito mais ainda desse dinheiro podre e indecente…um outro astro do jogo, Rothen, do PSG, publicou ( escreveu ? ) um livro de confidências, historinhas relatando entre outros uma fala desgraciosa do mestre absoluto do universo o nosso Zizou nacional : ele teria falado "filho-da-puta, levanta ai" ao nosso amigo Rothen durante um jogo no qual ele se machucou. Aí, parece que nosso cabeceiro não gostou da confidência e chamou a mídia em Paris para explicar ao mundo –muito preocupado com isso – que ele não tinha usado essas palavras horrorosas durante aquele jogo…dez minutos no jornal nacional…Antes dos 70 crianças mortas em Haiti e outros assuntos mais leves como guerra na RDC, crise financeira e recessão econômica, etc…ainda bem que o nosso forum nacional aproveitou para iluminar o universo com analises fundamentais tais como "não gostou de politica (…) a eleição do Obama foi uma grande noticia (…) o dopagem é ruim"

Pô, João o utopista, que peitava a ditadura de todo um continente, transformando o futebol com o maior meio de comunicação da humanidade progressista…meu Deus, esse tempo é longe, muito longe…O que o maragato gaúcho falaria desse dinheiro podre sim indecente sim que rola solto – e bem lavadinho – saindo dos bolsos mais duvidosos da nossa terra ? Volte joão, vê aí um esquema com o barbudo pra voltar só 6 meses… "o senhor organiza seu ministério eu organizo eu time"…na verdade não sei não se vale mesmo…e de dar medo, muito medo mesmo…

Jon Itcaina é basco, francês, brasileiro, advogado, torcedor do Bordeaux, apaixonado por futebol e samba.

PELÉ, A “OVELHA BRANCA” DO FUTEBOL BRASILEIRO


Pelé - Comemoração usada em larga escala pela ditadura brasileira

                           Quando Emílio Garrastazu Médici toma posse da presidência da República em 30 da outubro de 1969, sua paixão pelo futebol vai além do limite de torcedor, e sua influência é direta no esporte. Logo o advento de Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, surge como saída mais do que desejosa para a propaganda de governo que fará de sua imagem o símbolo do país em desenvolvimento:
(...) Grudado no radinho de pilha – imagem que o aproximava do ‘homem comum’ -, o novo presidente se arriscou várias vezes a freqüentar estádios lotados, não raro tendo sua presença anunciada pelos auto-falantes. Promovia-se assim uma importantes estratégia de propaganda da Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP), no sentido de transformar o general Médici em torcedor número 1 da nação, articulando os trunfos futebolísticos à imagem de Brasil-potência que o governo se esforçava em difundir (...) A medida que a copa de 1970 se aproximava, as possibilidades da interação futebol-poder se ampliavam. Ainda em 1969, apresentou-se uma oportunidade sem igual para o governo: a festa comemorativa em torno do milésimo gol de Pelé, conquistado pelo craque, em novembro, no Maracanã. Nos dias seguintes a seu feito sensacional, Pelé desfilou em carro aberto em Brasília, sendo recebido pelo presidente Médici, que lhe concedeu a medalha de mérito nacional e o título de comendador. No jogo seguinte do Santos no Mineirão, o atleta recebeu uma coroa de ouro do Império, ao mesmo tempo em que era produzida uma infinidade de marcos comemorativos como medalhas, selos, bustos, placas e troféus” [1]
A propaganda foi uma das armas de repressão mais eficientes do início da década de 70. Amparado por uma sensação de bem estar, muitas vezes apoiada pela simples proliferação de bens de consumo, sobretudo o aparelho de televisão, o regime trabalhava de forma objetiva no uso da mesma para angariar aceitação popular:
O governo Médici não se limitou à repressão. Distinguiu claramente um setor significativo mas minoritário da sociedade, adversário do regime, e a massa da população que vivia um dia-a-dia de alguma esperança nesses anos de prosperidade econômica. A repressão acabou com o primeiro setor, enquanto a propaganda encarregou-se de, pelo menos, neutralizar o segundo. Para alcançar este último objetivo, o governo contou com o grande avanço das telecomunicações no país, após 1964. As facilidades de crédito pessoal permitiram a expansão do número de residências que possuíam televisão: em 1960, apenas 9,5% das residências urbanas tinham televisão; em 1970, a porcentagem chegava a 40%. Por essa época, beneficiada pelo apoio do governo, de quem se transformou em porta-voz, A TV Globo expandiu-se até se tornar rede nacional e alcançar praticamente o controle do setor. A propaganda governamental passou a ter um canal de expressão como nunca existira na história do país. A promoção do “Brasil grande potência” foi realizada a partir da Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP), criada no governo de Costa e Silva, mas que não chegou a ter importância nesse governo. Foi a época de “Ninguém segura este país”, da marchinha Pra frente Brasil, que embalou a grande vitória brasileira na Copa do mundo de 70”. [2]
Consagrado tricampeão do mundo no México, o Brasil era, por meio da ditadura militar, embebido com ufanismo e “otimismo”:
Em pleno carnaval da vitória de 70, o general Médici, ditador do Brasil, presenteou com dinheiro os jogadores, posou para os fotógrafos com troféu nas mãos e até cabeceou uma bola na frente das câmaras. A marcha composta para a seleção, Pra frente Brasil, transformou-se na música oficial do governo, enquanto a imagem de Pelé voando sobre a grama ilustrava, na televisão anúncios que proclamavam: Ninguém segura o Brasil” [3]
O governo do general Médici foi de longe o mais violento das ditaduras brasileiras. Enquanto a sociedade centrava-se na participação do país no mundial e comemorava um milagre econômico (cujo prazo de validade não consultou) as esquerdas que levantaram suas armas contra o regime, eram caçadas e desintegradas, ao mesmo tempo em a chamada oposição legal atingia seus índices mais baixos no poder legislativo. Pelé, cujo status não encontrava fronteiras pelo mundo, finalmente fala sobre o seu país, ainda que suas palavras passem muito longe da realidade:
Inquirido, em 1972, sobre a ditadura militar em seu país, Pelé respondeu: Não há ditadura militar no Brasil. O Brasil é um país liberal, uma terra de felicidade. Somos um povo livre. Nossos dirigentes sabem o que é melhor para nós, e nos governam com tolerância e patriotismo” [4]
Se por um lado, Garrincha representava no futebol o país que não dava certo, pois não seguia regras disciplinares e conduta de vida vistosa, além de se relacionar com pessoas “erradas”, por outro, Pelé representa não somente os interesses do regime político do país, mas também a ausência da própria voz como representatividade social do negro:
Pelé nunca conclamou os negros ou os pobres a aspirar ao sucesso que ele tinha conseguido, suas mensagens se encaixavam claramente nos valores que prevaleciam na sociedade brasileira. Quando Mohamed Ali, então Cassius Clay, recusou o alistamento no exército americano, Pelé criticou-o publicamente, relembrando seu próprio serviço militar”[5]
No ano de 1961, Pelé lança uma autobiografia, analisada pelo Professor Matthew F. Shirts, da Universidade de Barckley (EUA), especialista em Literatura Futebolística, observando o livro dentre certa periodização deste tipo de escrita:
Neste quadro, surge, em 1961, Eu sou Pelé, a autobiografia do mundialmente conhecido jogador. Trata-se, na verdade, de um depoimento, recolhido e escrito pelo jornalista Benedito Ruy Barbosa (atualmente dramaturgo). A linguagem é simples, simplicíssima. História narrativa, linear, começa com o próprio nascimento do Pelé – “é assim que eu imagino a cena da noite do meu nascimento... (p.12)” - , terminando com a promessa de defender “o próprio Santos até quando puder, mas será apenas pelo prazer de jogar, pela alegria de ser útil à Pátria... (p.185) (...) Facilmente lido e entendido, e enquadrado em um meio tipicamente popular, esta obra presta-se à demagogia. Aliás, a demagogia parece ser uma constante na vida pública de Pelé. Seja como for, Eu sou Pelé é maciçamente moralista. Constrói-se a “figura Pelé” para o consumo de massas. Ele é pintado como o “moreninho bonzinho” que, embora tenha deixado a escola, “subiu” na vida por ter respeitado cegamente todas as regras estabelecidas” [6]
Assim, quase uma década antes, o próprio Pelé já trabalhava uma imagem que foi amplamente explorada nos anos de chumbo, sobretudo no governo Médici. É compreensível que sua imaturidade (aos vinte anos) tenha lhe conduzido para às luzes de tudo que o futebol trazia. No entanto, na Copa de 70, seus trinta anos lhe poderiam ser suficientes para uma nova observação de seu contexto.
Em 1974, Pelé transfere-se para os New York Cosmos (EUA), clube conhecido mais pela contratação de grandes nomes do futebol (Franz Beckenbauer, Johan Neeskens, Carlos Alberto Torres, George Best, Johan Cruiiff, por exemplo) do que essencialmente pela tradição futebolística (que os norte-americanos ainda não conseguiram). Interessava não mais o jogador de futebol, mas o mito, a imagem.
Este mesmo ano ficaria marcado pelas grandes mudanças mercadológicas e comerciais promovidas no futebol mundial (com velocidade acelerada, pelas mãos de João Havelange[7]), e pela política brasileira (lenta, gradual e segura).
[1] Agostino, Gilberto. “Aquela corrente pra frente”. In: Nossa História. Ano 2 / n.o 14 – Dezembro/2007. p.17
[2] Fausto, Boris. História do Brasil. p. 484
[3] Galeano, Eduardo. Futebol ao Sol e Sombra. p. 136-137
[4] Entrevista cedida por Pelé, a Amália Barran, in: La Opinion (Montevideo), 1972, recorte cortesia de Leoncio Basbaum, citado por Levine, Robert M. “Esporte e Sociedade: O caso do futebol Brasileiro”. In: Maihy, José Carlos Sebe B; Witter, José Sebastião (org). Futebol e Cultura – Coletânea de Estudos. p.36
[5] Levine, Robert M. “Esporte e Sociedade: O caso do futebol Brasileiro”. In: Maihy, José Carlos Sebe B; Witter, José Sebastião (org). Futebol e Cultura – Coletânea de Estudos. p.36
[6] SHIRTS, Matthew G. “Literatura Futebolística: uma periodização. In: Futebol e Cultura - Coletânea de estudos. MEIHY, José Carlos Sebe Bom; Witter, José Sebastião (org). São Paulo. IMESP/DAESP. 1982. p. 55
[7] Leia o post "JOÃO HAVELANGE FOI A "CARA" E A "COROA" DO FUTEBOL MUNDIAL  http://kigol.com.br/blog/view/post/jo-o-havelange-foi-a-cara-e-a-coroa-do-futebol-mundial

JOÃO HAVELANGE: A “CARA” E A “COROA” DO FUTEBOL MUNDIAL*



Por Adriano C. Tardoque

É fundamental para a compreensão de alguns dos principais aspectos do futebol brasileiro, traçar a sua relação com o período da ditadura no país (1964-1985), sobretudo a tutela militar do esporte e a sua abertura mercadológica, como parte da trajetória do ex-presidente da CBD e da FIFA, João Havelange. Ele esteve a frente da entidade máxima de administração do futebol brasileiro, presidindo a CBD dentre 1958 e 1970. Após a conquista do bicampeonato de 62 e o fracasso de 66, impõe mudanças fundamentais nas estruturas da Seleção Brasileira,  principalmente ao criar uma Comissão Selecionadora Nacional (Cosena), com base na disciplina militar, refletindo a condição política do país, naquele momento. Tão logo o órgão não apresenta os resultados desejados, frente à pressão de federações, clubes e diferentes interesses, somados aos maus resultados em campo obtidos pela seleção, derivam em seu encerramento. Na ânsia de acertar os passos da seleção brasileira, Havelange não abre mão de nenhum tipo de artifício: contrata como técnico o jornalista e radialista João Saldanha, que expressava valores contrários a condição golpista da política brasileira e era acusado de “comunista”, despertando assim a antipatia da imprensa paulista (pela escolha de um carioca para o cargo) e por parte de núcleos militares conservadores, que não acreditavam ter um "comunista" no comando do selecionado (falava-se em "rendição" a um “inimigo”). Os frutos dessa empreitada causaram surpresa:

“Assumindo o cargo, o novo técnico fez bom uso da geração privilegiada que tinha em mãos e angariou uma série de triunfos, aproximando a Seleção do homem comum, dos militares e até mesmo dos militantes de esquerda. Estádios ficavam lotados e o hino Nacional voltou a ser cantado sem a pecha de adesão à ditadura que passou a caracteriza-lo a partir de 1964. Uma pesquisa feita no Rio, apontava a popularidade de Saldanha: 71%. Os paulistas, em fim rendidos ao bem-sucedido desempenho do técnico, não ficaram muito atrás: 68%. Mesmo com estes índices, por mais que Saldanha estivesse consolidado no cargo, as tensões políticas cresciam em um país marcado pela repressão, que viera à tona na esteira do AI-5*, de Dezembro de 1968. Detentor do bicampeonato, o futebol brasileiro não podia passar incólume pela obsessão legitimadora que o governo militar perseguia permanentemente, passando a interferir cada vez mais nas esferas do esporte.” [1]

Em 31 de agosto de 1969, é anunciado aos brasileiros o Ato Institucional n.º 12 que transfere os poderes presidências para uma junta militar. No mesmo dia em que o Brasil joga sua última partida pelas eliminatórias para a Copa de 70, contra o Paraguai, partida que venceu por 1 a 0, com gol de Pelé. A classificação para a Copa do México, que poderia surtir como a estabilidade de Saldanha frente o comando da seleção brasileira não se confirma. As pressões políticas sobre o esporte mais popular do país são intensas. Quando em outubro de 1969, o general Emilio Garrastazu Médici assume a presidência, tomou uma série de medidas que articularam futebol e massa torcedora, com destaque a Loteria Esportiva, em 1970:

“Médici assina o decreto que instituía a loteria Esportiva no país, procurando conciliar o esporte com a sorte, enriquecimento fácil e chance de mobilidade social para todos. Válido inicialmente para Rio de Janeiro e São Paulo, o presidente prometia que até a Copa o jogo seria ampliado para todo o Brasil”.[2]

Dentro de campo, o Brasil sofria algumas derrotas em amistosos. Fora dele, a comissão técnica dividida e as críticas de outros treinadores se intensificam. Foi neste momento, em que o time está considerado “desarrumado”, que aconteceu um evento que envolve diretamente o presidente e João Saldanha. Consta que o presidente Médici teria sugerido a escalação de Dadá Maravilha como uma possível solução ao time. Diante desta colocação, Saldanha teria respondido: “Pois olha: o presidente escala o ministério dele que eu escalo meu time”. Decerto, a figura do treinador “não descia” para os militares, e qualquer motivo frente o atual momento da seleção era o suficiente para aumentar a instabilidade:

“Não se sabe ao certo se Médici estava tão empenhado na escalação de um jogador específico, em um momento em que os desafios governamentais eram muito grandes. Certo sim é que a figura de Saldanha era considerada muito inconveniente pelo seu destempero e por propalada independência. Temia-se que o treinador chegasse ao México com uma lista de presos políticos no bolso, e, em entrevista coletiva, diante dos microfones e câmeras do mundo todo, denunciasse o desrespeito aos direitos humanos que vinha ocorrendo no Brasil. Mais do que Dario ou episódios envolvendo jogadores e técnicos, esta era uma preocupação muito séria para a imagem que a ditadura queria promover de si mesma no exterior. E como bem ou mal Saldanha era popular, pretextos paralelos ganharam mais projeção do que deviam, condicionando a queda do treinador principalmente a problemas com Pelé, com Yustrich – técnico que cobiçava o cargo – ou com um amistoso contra o Bangu, em que a seleção brasileira jogou muito mal. Alguns dias depois a comissão técnica foi “dissolvida” e Mário Jorge Lobo Zagallo, que treinava o Botafogo, foi apresentado como sucessor de Saldanha”. [3]

Logo, com o afastamento da comissão técnica antiga, João Havelange passa a atuar livremente e passa a trabalhar sua proposta de militarização da delegação brasileira que seguiria para o México:


“Esta era chefiada pelo major–brigadeiro Jerônimo Bastos, com a segurança ficando a cargo do major Ipiranga dos Guaranys, além de contar ainda com os militares Cláudio Coutinho, Raul Carlesso e José Bonetti, alguns deles integrantes da antiga Cosena”. [4]

As regras disciplinares competem desde os cabelos cortados ao estilo militar, passando por intensa preparação física e inflexibilidade com horários e compromissos. O historiador Gilberto Agostino aponta que “contraditoriamente, a Seleção se transformaria, dentro em campo, em paradigma do verdadeiro futebol-arte que tanto se fala desde então. A cada vitória, uma aclamação popular que parecia legitimar o próprio regime” [5].

Paulo César Caju, jogador que atuou nas décadas de 60 a 80 em diversos clubes dentro e fora do Brasil, como Botafogo, Flamengo, Fluminense, Vasco, Grêmio e Olympique de Marselha (França), disputando também duas Copas (1970 e 1974), sempre foi conhecido pelo temperamento contestador: “Há uma indisciplina, porém, a Paulo César, que a CBD não digere: a do jogador que assume a sua identidade de proletário e, ao assumi-la, denuncia o sistema, reivindica direitos de trabalhador qualificado e lidera os demais”[6]. No entanto, em entrevista recente concedida a uma revista de esportes, parece concordar com o sistema de trabalho imposto pelos militares na Copa do tricampeonato. Quando indagado se os militares atrapalhavam ou influenciavam demais no time, respondeu:

“Não. Naquele time nós tínhamos o Pelé, que já era bicampeã mundial pelo Santos e bicampeão mundial pela Seleção, em 58 e 62. Então seguimos o que Pelé traçou para ele. Tínhamos o rei junto com a gente (...) Eles vieram com a disciplina que o futebol brasileiro não tinha. Estabeleceram rigidez, treinamento, horários, coisas que nós sempre precisamos. É uma competição de um mês e sem essa disciplina não se vai a lugar algum (...) Nós tínhamos liberdade e podíamos sair uma vez por semana, só isso. Acho normal. Se você tem um grupo que se entende bem, com o mesmo objetivo, não vejo problema nenhum”. [7]

O tempo é capaz de gerar concordâncias e aceitações impensadas em épocas passadas. Seguir o que Pelé traçou para seu próprio caminho, certamente traz compreensão do envolvimento dos atletas com o regime, como fica claro quando analisada de forma mais aprofundada a trajetória do Rei do Futebol.

Em 1972, organiza um torneio chamado Taça Independência, em comemoração ao sesquicentenário da Independência do Brasil, que contou com a presença de vinte seleções. Alemanha, Inglaterra e Itália não participam do evento, compreendendo que a mesma direcionava-se a fins políticos. Pelé, finalmente, se nega a participar por entender (tardiamente!) que a ditadura tem feito uso de sua imagem para se legitimar no exterior. Contudo, ainda assim esteve diretamente ligado ao processo que elegeu Havelange a presidência da FIFA

“Apesar de não ter jogado a Taça Independência, Pelé foi uma figura central na eleição de Havelange para a FiFA. Desde o final dos anos 60, a relação entre os dois vinha se estreitando, muito em parte em função das necessidades do jogador, que perdera um bom dinheiro em uma série de negócios em Santos. Em 1969, em um dos lances mais citados na carreira do Rei, Havelange organizou uma excursão da equipe santista à África, já pensando nos votos que poderiam ser colhidos nas federações Africanas. Após passarem por diversos países, o pretendente ao cargo maior da FIFA, divulgou a história de que o carisma de Pelé interrompera a guerra civil da Nigéria, versão até hoje repetida como demonstração não só do mito em torno do jogador, mas também da capacidade de conciliação que o esporte pode propiciar. Posteriormente, à medida que a relação entre os dois foi esfriando, Pelé apresentou uma versão um pouco menos romântica da história (...) “nós jogamos na capital da Nigéria (a região de Biafra estava em guerra, iniciada em 1967 e encerrada três anos mais tarde), e o que aconteceu foi que o governo destacou um baita contingente militar para nos proteger, impedindo que a cidade fosse invadida enquanto estivéssemos lá”.[8]

Eleito presidente da FIFA em 1974, João Havelange conciliou durante pouco tempo a presidência da CBD com a do órgão internacional. Com o desgaste das relações com os militares, agora representados na figura do general e presidente Ernesto Geisel (que a esta altura vigiava através do DOPS tanto o dirigente quanto o próprio Pelé), é afastado em 1975, assumindo entidade máxima do futebol brasileiro o almirante Heleno Nunes, autor da "máxima" frase sobre a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), partido governista dos militares: “Onde a Arena vai mal, um time no Nacional!” [9].

A tendência do pensamento de mercado voltado para o futebol, ganha força no futebol mundial quando João Havelange, que assumiu a presidência da FIFA em 1974, emprega-lhe novo formato. A visão comercial e a disciplina são as chaves para o sucesso de sua administração. Sua influência atinge dimensões não imaginadas nos meios futebolísticos:

“Em 1974, depois de subir muito, Jean Marie Faustin de Godefroid Havelange conquistou a cúpula da FIFA. E anunciou: 'Vim vender um produto chamado futebol'. Desde então, Havelange exerce o poder absoluto sobre o futebol mundial. Com o corpo grudado no trono, rodeado por uma corte de vorazes tecnocratas, Havelange reina em seu palácio em Zurique. Governa mais países que as Nações Unidas, viaja mais do que o Papa, e tem mais condecorações que qualquer herói de guerra (...) Havelange nasceu no Brasil (...) mas suas opiniões são pouco brasileiras. Um jornalista inglês, do Times de Londres, lhe perguntou: 'O que lhe dá mais prazer no futebol: a glória? A beleza? A vitória? A poesia?”. E ele respondeu: A disciplina' (...) Este idoso monarca mudou a geografia do futebol e transformando-o num dos mais esplêndidos negócios multinacionais. Em seu mandato, dobrou a quantidade de países nos campeonatos mundiais: eram dezesseis em 1974, serão 32 em 1998. E pelo que se pode adivinhar através da neblina dos balanços, os lucros que esses torneios rendem multiplicam-se tão prodigiosamente que aquele famoso milagre bíblico, o dos pães e os peixes, parece piada (...) Os novos protagonistas do futebol mundial, países da África, Oriente Médio e Ásia dão a Havelange uma ampla base de apoio, mas seu poder se nutre, sobretudo, da associação com algumas empresas gigantescas como a Coca-Cola e a Adidas. Foi Havelange quem conseguiu que a Adidas financiasse a candidatura de seu amigo Juan Antonio Samaranch à presidência do Comitê Olímpico Internacional. Samaranch, que durante a ditadura de Franco (na Espanha) soube ser homem de camisa azul e braço estendido (referência ao fascismo), é desde 1980 o outro rei do esporte mundial”. [10]

Com as portas abertas para o investimento de patrocínio, tanto os selecionados dos países quanto dos clubes, passaram a ter em seus jogadores, o foco principal da divulgação de marcas e grifes. Esse fenômeno tomará maiores proporções proporções nos anos 80, explodindo definitivamente na década de 90, criando novas configuração de contratos de trabalho para os atletas, dificultando ainda mais a questão do profissional de futebol quanto a sua organização em classe trabalhadora, uma vez que nem todos os contrato atendem ao interesse coletivo e da agremiação, privilegiando os ídolos do esporte em franca evidência, definidos hoje como "galácticos".

[1] Agostino, Gilberto. “Aquela corrente pra frente”. In: Nossa História. Ano 2 / n.o 14 – Dezembro/2007. p.16
[2] Idem. p.17
[3] Idem. p.18
[4] Idem. p. 18
[5] Idem. p. 19
[6] Santos, Joel Rufino. História Política do Futebol Brasileiro. p. 89
[7] Merguizo, Marcel. “Caju com açúcar”. In: A+ - A Revista do LANCE. Ano 7/ número 297. De 20 a 26 de maio/2006.
[8] Agostino, Gilberto. “Aquela corrente pra frente”. In: Nossa História. Ano 2 / n.o 14 – Dezembro/2007. p.20
[9] Idem. p. 20
[10] Galeano, Eduardo. Futebol ao Sol e Sombra. p. 143-144

* Publicado originalmente como capítulo com o título "João Havelange: a nova 'cara' e a velha 'coroa' do futebol" da monografia A Construção da Democracia Corintiana para Trabalho de Conclusão do Curso de História na Universidade Nove de Julho, em 2006, sob orientação do Professor Fabio Franzini.

ATENÇÃO: Para quem acredita que João Havelange não "apita" mais nada:


http://globoesporte.globo.com/ESP/Noticia/Futebol/Campeonatos/0,,MUL166569-9790,00.html

GARRINCHA - A "OVELHA NEGRA"


Por Adriano C. Tardoque

A final da Copa do Mundo de 1962, entre Brasil e Tchecoslováquia (resultando em 3 a 1 para a seleção canarinho) foi a primeira a ser transmitida ao vivo pela televisão, em preto e branco, para alguns países do mundo. Além do bicampeonato mundial para o Brasil, este torneio selava na ausência de Pelé, contundido, o nascimento da mítica figura de Garrincha como ídolo do futebol. Considerado indisciplinado e boêmio, o “Mané”, como era chamado, não se enquadrava no perfil do atleta moderno, das capacidades físicas plenas e obediência:

“Algum de seus muitos irmãos batizou-o de Garrincha, que é o nome de um passarinho inútil e feio. Quando começou a jogar futebol, os médicos o desenganaram: diagnosticaram que aquele anormal nunca chegaria a ser um esportista. Era um pobre resto de fome e de poliomielite, burro e manco, com um cérebro infantil, uma coluna vertebral em S e duas pernas tortas para o mesmo lado” [1]

O futebol mostrou que o “cérebro infantil” de Garrincha, tal qual a sua atribuição, o levava a brincadeiras dentro de campo que representavam a mais pura arte e descontração, características do futebol brasileiro. Suas “pernas tortas” como instrumentos de sua mente brincalhona desesperava seus adversários, arregalando olhos e derrubando os queixos nas arquibancadas. Expulso no jogo da semifinal, na vitória de 4 a 2 contra o Chile, o Mané contou com uma intervenção direta do presidente do Brasil, João Goulart, para sua participação no jogo da final:

“Jango acompanhava todos os jogos através do rádio, tendo a seu lado o popular ministro da guerra, marechal Henrique Lott (1894-1984), ou o primeiro-ministro, Tancredo Neves (1910-1985), o que a imprensa nacional noticiava fartamente. Veio a semifinal, e Garrincha foi expulso. O Brasil, que já perdera Pelé por contusão no segundo jogo, ficaria sem seus dois principais jogadores. O presidente acionou o primeiro-ministro e os dirigentes do nosso futebol para que intercedessem junto a FIFA, e aos organizadores do torneio, para que Garrincha fosse perdoado, o que, de fato, ocorreu" [2]

Sua arte lhe rendeu dinheiro e fama, e como não poderia deixar de ser, fez pesar sobre sua imagem, responsabilidades além daquelas que escolhera. Estar nas “graças” de João Goulart, não seria bom negócio, nos dias anos subsequentes. Logo estava perseguido pela mídia e pela “moral pública”, após a revelação de sua relação com a cantora Elza Soares, por quem abandonara a família. Elza, politizada e apoiando o então presidente João Goulart esteve presente no discurso pró-reformas em 13 de março de 1964, para quem se apresentou em show no dia 30 de março do mesmo ano, um dia antes do golpe militar. Como resultado destas “relações”, Elza e Garrincha tiveram sua casa invadida e sofreram ameaças:

“Os homens que invadiram a casa de Garrincha e Elza podiam pertencer a qualquer um desses grupos (exército e marinha), mas não deixaram registro escrito em nenhum órgão daquela época. E também não apresentaram cartões de visita (...) Na casa estavam Garrincha, Elza, dona Rosária, e três filhos de Elza: Carlinhos, Dilma e Gilson. Os homens os puseram nus contra a parede da sala enquanto reviravam a casa pelo avesso. Não disseram se estavam, procurando alguém ou alguma coisa, mas, no meio da confusão, Elza julgou ouvir várias vezes o nome de Jango. Não podiam estar procurando o presidente deposto – este já estava posto em sossego desde o segundo dia do golpe, numa de suas fazendas no Uruguai (...) Aparentemente satisfeitos com o estrago, os sujeitos foram embora. Não levaram nada. Mas, para provar que não estavam brincando, um deles antes de sair, trouxe a gaiola com o mainá para a sala. Abriu a portinhola e tirou o mainá lá de dentro. Depois de exibi-lo para Garrincha e os outros, torceu-lhe o pescoço. Atirou-o morto no chão e saíram (...) Dois dias depois os jornais deram a notícia , mas convenientemente maquiada: a casa de Garrincha e Elza fora arrombada enquanto eles dormiam. Os ladrões haviam matado o pássaro que ele ganhara de Lacerda. Os homens teriam entrado e saído em silêncio que só de manhã os donos da casa viram o que acontecera (...) Elza queria evitar que a notícia ganhasse conotação política. Garrincha tentou minimizar a história' [3]

Garrincha que não tinha engajamento político algum, por força das suas relações cotidianas e pessoais, se vê entre embates de “direita e esquerda” pelo simples fato de ser uma estrela do futebol. Suas escolhas independem algumas vezes de sua própria vontade, ficando a mercê de políticos ou cartolas:

“O jogador brasileiro é de todos o que menos dura em atividade e talvez não haja na história do futebol, crueldade maior do que a praticada contra Garrincha, reconhecido no exterior após o bicampeonato (1962) como melhor ponta direita do mundo. 1963, o joelho do campeão começa a falhar, a cada partida incha e dói. Interessado na bilheteria, o Botafogo se recusa a interna-lo para operar e o induz a aceitar o “joelho aplicado” – infiltração de analgésico antes do jogo e punção de água que se formava em torno da rótula. No mesmo ano, o Juventus (Itália) oferece 700 mil dólares àquele clube e 60 milhões de cruzeiros ao jogador pelo passe., comprometendo-se a trata-lo. O Botafogo não aceita a proposta e nega a Garrincha os 18 milhões de cruzeiros requeridos para renovar o contrato. Em 1966 vende-o ao Corinthians quase de graça" [4]

Em 1966, já decadente, Garrincha disputou sua última copa do pelo Brasil. Graves problemas no joelho, alcoolismo e ostracismo, levam-no ao encerramento da carreira e a morte na pobreza e esquecimento, em 1983. Representava de longe o “bom mocismo” do futebol, imagem esta que Pelé, carregava só e muito bem amparado.

[1] Galeano, Eduardo. Futebol ao Sol e Sombra. p.106
[2] Barreto, Túlio Velho. “A copa do mundo no jogo do poder”. In: Nossa História. Ano 3 no 32 – Junho 2006. p. 61
[3] Casto, Ruy. Estrela Solitária – Um brasileiro chamado Garrincha. P. 324-325
[4] Milan, Betty. Brasil: o País da Bola. p.26

* Publicado originalmente como capítulo da monografia "A Construção da Democracia Corintiana" para Trabalho de Conclusão do Curso de História na Universidade Nove de Julho, em 2006, sob orientação do Professor Fabio Franzini.

PELAS "CONSPIRAÇÕES" E GEOPOLÍTICA, A ESPANHA É CAMPEÃ EM 2010 - 02/06/2010


 Jogadores da Espanha comemoram um gol: mais do que ganhar a Copa, precisam "salvar" a Europa... O Mundo!

Linl da postagem original: http://kigol.com.br/blog/view/post/pelas-conspira-es-e-geopol-tica-a-espanha-leva-a-copa

Recebi um e-mail de um amigo francês que mora no País Basco, cujo tema era futebol. Mas, como sempre, nossas trocas de e-mail vão trilhando diversos caminhos. Um deles foi a constatação por parte dele, de que a Europa está prestes a entrar em colapso, novamente. As tv's francesas tem levado ao ar diariamente as questões político-econômicas do país e da zona do Euro; a França quer pular fora do barco. A Alemanha tenta segurar todo mundo, enquanto que a Inglaterra está, como sempre, "indiferente" a agitação dos demais. A Espanha que cresceu muito e estagnou, encontra-se no meio termo entre os países mais "pobres" da Europa, os PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia - a Espanha é o "S" de Spanish). Segundo meu amigo, os espanhóis estão "na beira do abismo" e basta um sopro para cair, fato esse que , se vier a se concretizar, joga a Europa no inferno. Pois bem... Pensando de forma geopolítica, e dando um "gás" nas idéias conspiratórias, será essencial para passar pela crise que enfrenta, que a Espanha vença a Copa do Mundo de 2010. Segundos cálculos estatísticos de "economistas" e "matemáticos" ingleses, a final pode ocorrer em duas alternativas: INGLATERRA X ESPANHA ou BRASIL X ESPANHA. Na primeira hipótese, vencem os herdeiros de Hernán Cortez. Na segunda, os meninos de Gilberto Freyre.
A idéia das conspirações em Copas do Mundo é um tema antigo. Milhares de pessoas acreditam que é um evento, assim como os Jogos Olímpicos, de “conformização” de demandas do capitalismo, seja na adequação e inserção de países na estrutura capital gestada pelo Ocidente (como a última Olimpíada na China), ou para criar novas formas de recuperação do capital europeu em solo alheio (como promover no Brasil, de uma só vez, Copa do Mundo e Olimpíadas, uma vez que é um país emergente e não oferece tanto risco como a atual desgrenhada Europa). Mas e o talento, não pesa? Sim. As teorias são estapafúrdias, muitas vezes. Mas lembremos (1):


  • México 1970: O Brasil é tricampeão, enquanto a ditadura, amparada pelos EUA, aniquila a guerrilha pelas ruas das grandes capitais do país.


  • Alemanha 1974: Capitalismo e Socialismo estão literalmente em campo. A “conspiração” é para reafirmar o sistema. A Alemanha da República vence uma das maiores seleções de todos os tempos, a Holanda de Cruyff e cia, na final. Mas levou um “carimbo” de classe na faixa: perdeu de 1 a 0 para a Alemanha Oriental (comunista), gol de Juergem. Também foi ano da Revolução dos Cravos em Portugal. Caiu a ditadura na Grécia. Franco sai do poder na Espanha. Pinochet mata opositores no Estádio Centenário, no Chile.


  • Argentina 1978: A mais “descarada” tramóia das Copas do Mundo. O Peru “entrega” o jogo para a Argentina, o Brasil tem gol anulado e fica de fora da final. Os donos da casa, em meio a ditadura, vencem. Um documentário recente, FUIMOS CAMPEONES, devassa este mundial. Vide link: http://www.lsf.com.ar/libros/28/FUIMOS-CAMPEONES-LA-DICTADURA-EL-MUNDIAL-78-Y-/


  • Espanha 1982 – O Papa sofre um atentado e sobrevive. Comoção Mundial... A última grande Seleção Brasileira, sob a batuta de Telê Santana é desclassificada pela Itália (que vence a Copa sobre a Alemanha, na final). Conspiração? O Brasil não ter levado!


  • México 1986 – A Argentina, sofrega com as dores da Guerra das Malvinas e recém redemocratizada, vence a Inglaterra com gol de mão de Maradona, em estado de graça. Na final, derruba a Alemanha.


  • Itália 1990 – A Copa mais “sem graça” de todas. Muro de Berlim caindo, unificação das alemanhas. Bloco socialista se desintegrando. Vitória do capitalismo! A Alemanha recebe da Argentina o presente: um pênalti na final e 1 a 0 para os germanos.


  • EUA 1994: O Brasil se insere em uma nova era do capitalismo mundial Recebe a Copa como incentivo. Nada melhor que a casa de quem arruma todas as coisas, os EUA (que perderam para a seleção canarinho por 1 a 0 em 4 de julho (feriado da Independência dos EUA). He he he!


  • França 1998: Uma final sinistra com o Brasil, deu o título para a França em casa. O país passava por graves problemas econômicos e precisava “encobertar” os altos índices de desemprego. O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, teria “vendido” a Copa e os jogadores se rebelaram. A promessa é que 2002 seria “facilitada” para o Brasil. Feito.


  • Japão e Coréia do  Sul 2002 – Campeões, conforme o prometido anteriormente!


  • Alemanha 2006 – A Itália, que passava por uma grave crise em seu futebol, tendo a Juventus rebaixada por compra de resultados; escândalos de loterias; máfia no poder (permanece); crise econômica (permanece), vence a Copa com o time mais “meia-boca” da sua história, sobre a França (que “devolvia” o “favor” prestado pelo Brasil.


  • África do Sul 2010 – Se a Espanha quebrar, metade da Europa afunda. Precisa da Copa!
 (1) Deixei as Copas de antes de 1970 de lado... Seria "conspiração" demais para nossa cabeça!
 PS: No "bolão", apostei Inglaterra campeã em 2010.

 Por Adriano Tardoque

FIGURINHAS DA COPA: UM FENÔMENO DE SOCIABILIZAÇÃO - 19/05/2010

São 10 horas da manhã do dia 15 de maio de 2010. A revistaria Oficina Cultural, no bairro de Santa Terezinha, Zona Norte de São Paulo, está absolutamente cheia: pessoas ocupam as mesas do café, as bancadas de livros, a calçada, a praça do outro lado da rua. Para quê? Trocar figurinhas!
Jovens mães, sentadas no chão, com caneta e papel, riscando os números daqueles crômos que negociou para o filho de 4 anos; na calçada, a avó de uns 80 anos, segura uma quantidade enorme de figurinhas, enquanto que seu filho, de cabelos grisalhos, ri com outro homem de sua idade, avaliando as trocas que seus filhos estão fazendo, num alvoroço enorme, sob uma caixa de papelão, improvisada como mesas. Crianças, jovens, adultos, idosos. O clima é de descontração. As trocas obedecem regras diversas: crômo brilhante, só por duas ou mais; figurinha para completar time, vale de 4 a 10 novas; figurinhas de bônus para "bons trocadores", dentre outras situações. 
De uma coisa eu não tenho dúvida: o álbum de figurinhas da COPA DO MUNDO FIFA 2010, além de ser um dos maiores sucessos de publicação no Brasil, será também um marco para colecionadores de crômos e já é  um fenômeno de sociabilização.
Por Adriano Tardoque

domingo, 18 de julho de 2010

AFONSINHO, DÉCADA DE 70: JOGANDO SOZINHO PELA PROFISSIONALIZAÇÃO DO FUTEBOL


 Afonsinho - O jogador eo médico
O jogador Afonso Celso Garcia, o Afonsinho, foi o primeiro atleta a obter na justiça o passe livre, fato até então inédito no Brasil. Também caracteriza se como o primeiro responsável por uma ação política de contestação que efetivamente deriva em lei, partindo de um jogador e não de ações de interesses do Estado ou clubes. Além de seu “jogo” individual contra as estruturas oligárquicas das administrações dos clubes, chamou os demais atletas para o debate sobre a questão da profissionalização do futebol:

(...) Afonsinho, tornou-se um caso célebre por ser o primeiro futebolista a desafiar o sistema. Estudante de medicina da classe média e excelente jogador do Botafogo, Afonsinho iniciou um processo legal em 1974 no Ministério do trabalho pelo direito de negociar seu próprio contrato e de jogar para clubes de sua própria escolha. Vitorioso na justiça, passou de time para time, alugando seus préstimos por seis meses de cada vez e propagando abertamente os direitos dos atletas profissionais a se tornarem agentes livres. Fanfarrão, ele organizou uma equipe de protesto chamada a ‘Frente da Alegria”, um conjunto de profissionais ultrapassados, inconformados como ele, e aspirando a uma liga de jovens promissores em busca de publicidade. Como um articulador branco, foi tolerado, inda que fosse declarado pessoa não grata sem seu time de origem e afastado da Copa Mundial de 1974. Em certa ocasião jogou com Pelé no Santos, uma estranha combinação de dois símbolos do mundo do futebol”.[1]

Sobre a sua ação contra ao Botafogo e observação quanto ao profissional de futebol, em entrevista ao site do Jornal do Comércio de Recife, Afonsinho diz:

“O discurso dos diretores do Botagogo era esse: 'ele vai se enterrar vivo'. Mas deu errado. Depois do olaria, joguei no Flamengo, Fluminense, Vasco e Santos, conclui meu curso de medicina. Foi difícil, mas consegui encerrar minha carreira aos 35 anos. Eu não fui um Dom Quixote. Lutar pela liberdade foi uma opção consciente de vida (...) Tecnicamente eu não acredito que haja uma categoria profissional de jogador de futebol. Ainda é preciso construir essa consciência de que são uma categoria. A maioria não tem consciência política, não se interessa pelos seus assuntos. É muito complicado (...) Esse é um problema da sociedade brasileira. Não temos tradição de organização social. Futebol é coerente à sociedade que o espelha. Além do mais o jogador de futebol é um individualista por natureza. Ele não consegue enxergar o companheiro com o qual disputa a posição ou os adversários como integrantes do mesmo grupo (...) Hoje já há mais liberdade, há passe livre. Mas muitos direitos ainda não são respeitados”.[2]


Em 02 de setembro de 1976 foi sancionada pelo então presidente da República, general Ernesto Geisel, a Lei n. 6.354 que dispõe sobre as relações de trabalho do atleta profissional de futebol e dá outras providências sobre . Os artigos 3o, 4o, 6o 11o, 13o, 15o, 23o e 26o, são complementados pela Lei Pelé, N. 9615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências, sancionada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. [3]

A luta de Afonsinho nos anos 70, se não ratificou seu esforço com uma homenagem que atribuísse seu nome a alguma lei, uma “Lei Afonsinho”, como ocorreu com a Lei Pelé, ou a Lei Zico (evidentemente o nome de Afonsinho, nos meios futebolísticos passa longe dos holofotes que estes conseguiram, sobretudo pela "obediência a ordem"), mas deu o “ponta-pé inicial” para a organização do trabalho do atleta de futebol que, desde a metade da década de trinta, era considerado profissional. No entanto somente na metade da década de 70, mais de quarenta anos depois, efetivou-se um dispositivo de lei que o reconhecia o jogador profissional de futebol, mesmo em uma situação confusa e discrepante dos termos salariais e contratuais.

[1] Levine, Robert M. “Esporte e Sociedade: O caso do futebol Brasileiro”. In: Maihy, José Carlos Sebe B; Witter, José Sebastião (org). Futebol e Cultura – Coletânea de Estudos. p.37
[2] Entrevista publicada em 06/03/2006 no Site do Jornal do Comércio – Recife – PE. Disponível em http://jc.uol.com.br/jornal/2006/03/06/not_174992.php . Leitura em 21/10/2006.
[3] Leis do Esporte e Estatuto do Torcedor – Anotados. p.164-169

Para saber mais:

http://jbonline.terra.com.br/jb/papel/esportes/2006/01/07/joresp20060107004.html

http://www.partes.com.br/esportes12.html

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